domingo, 21 de junho de 2015

Domingos Montagner, o Miguel de 'Sete Vidas', diz que não atua para ser galã

Rio - É numa manhã nublada que vamos ao encontro de Domingos Montagner, na Marina da Glória, durante uma gravação de ‘Sete Vidas’. Atencioso e educado, o ator de 53 anos aproveita o intervalo do almoço para fazer as fotos dessa edição. “Não gosto de foto”, admite ele, que fica pouco à vontade diante da câmera. Mas nada de estrelismo. Até porque isso nem combina com o jeito tranquilão do intérprete do solitário Miguel, oceanógrafo e navegador que descobre ser pai de sete filhos, seis por inseminação artificial, na trama das seis.
“Me identifico com ele por entender que cada um tem a sua vida, não pode interferir na vida do outro. Não dou palpite se não me pedirem”, diz Domingos, que arremata: “Também gosto de ter meus momentos de solidão. Adoro reunir as pessoas, fazer churrasco, bater papo com todo mundo. Mas tem dia que quero sair sozinho, ir ao cinema”.
O sucesso não fez com que Domingos mudasse sua postura nem sua rotina. Esse paulista do Tatuapé é bem pé no chão, sem deslumbre com a profissão que iniciou há quase 30 anos. A carreira na TV só decolou há quatro temporadas, com ‘Cordel Encantado’ (2011). Hoje, curte, discretamente, a repercussão de seu primeiro protagonista em novelas.
“O êxito na TV é diferente do teatro porque a visibilidade é maior. Pelo ofício, não vejo diferença. O que muda é que você é mais reconhecido. Continuo trabalhando, porque sucesso é o canto da sereia, é efêmero. Meu chão é o trabalho”, enfatiza o ator, que é formado em educação física e deu aulas em várias escolas de São Paulo, durante dez anos, antes de se apaixonar pelos palcos do circo e do teatro. “Sou um cara muito satisfeito com as minhas escolhas. Me sinto privilegiado por fazer o que gosto”.
Com a escassez de atores talentosos e boa pinta na sua faixa etária, ele virou uma das apostas de galã da Globo. O rótulo já o incomodou muito por reduzir seu trabalho a um padrão estético. Mas, hoje, não dá importância.
“Prefiro ver como uma função dramatúrgica. Não entro numa novela para ser o galã. Se pensar assim, estou perdido”, avalia ele, que cita colegas de profissão que receberam o rótulo: “Se eu fizer 10% do que o Antônio Fagundes e o Francisco Cuoco fizeram, por exemplo, acho genial. Há atores que têm esse peso. Vai além do talento e da técnica”.
A maneira de lidar com a fama também é tranquila. Domingos não se incomoda em dar autógrafos e tirar fotos, contanto que não esteja com sua família. Casado há 13 anos com Luciana Lima e pai de três meninos — Dante, de 4 anos, Antônio, 8, e Léo, 12 — ele quer preservar a privacidade de todos. “Eu lido com isso com muita naturalidade. Mas, se estou num restaurante com meus filhos, não gosto. Não quero submetê-los a isso. Sou um cara reservado. Já passo por um processo de exposição enorme. Não fomento isso”, explica ele, que só usa as redes sociais para divulgar os espetáculos de sua companhia teatral. “Não coloco fotos da minha família no Facebook”.
Se existe um assunto que deixa o ator sem graça é o seu sucesso com as mulheres. Personagens como o capitão Herculano de ‘Cordel Encantado’ (2011), o sedutor presidente da República em ‘O Brado Retumbante’ (2012) e o turco Zyah em ‘Salve Jorge’ (2012) só ajudaram a acender mais o fogo do público feminino. “Não fico muito à vontade com isso. Não me vejo nesse personagem catalizador. Sou um cara tímido. Por isso, não gosto de fotos”, diz ele. “As mulheres são mais propensas a fazer fotos, mas sem afetação, sem loucuras”.
Na trama das seis, escrita por Lícia Manzo, Miguel tem dificuldades de estabelecer relações afetivas por causa de um trauma da infância — sente-se culpado pela morte da mãe. Apaixonado por Lígia (Deborah Bloch), não consegue se acertar com ela, nem com os sete filhos, seis deles frutos de doação de sêmen feita ainda na juventude.
“Ele começa a lidar com os filhos não por se sentir pai, mas por situações que o levam a mudar essa relação”, conta o ator, que aprova os casais (héteros ou homossexuais) que recorrem à inseminação artificial para ter filhos. “É um processo natural nos dias de hoje, um recurso válido. Sou de uma família tradicional, com pai e mãe. Mas o conceito de família é claro: são pessoas ligadas por laços afetivos”.
Se na ficção ainda está aprendendo a lidar com a prole, na vida real Domingos se desdobra para ser um pai presente, mesmo morando no Rio, por causa da novela, e os três filhos em São Paulo. “Ser pai é um chá de realidade. Você tem uma pessoa para educar. É a única relação para a vida toda”, resume ele, que ressalta a importância da referência paterna. “A maneira como você se relaciona com a mãe, os amigos e as pessoas do trabalho, a criança absorve isso tudo. É uma responsa, dá trabalho”.
Em casa, o ator gosta de brincar e comer junto com os filhos, mas criou alguns códigos. “Ensino o porquê dos limites. Quando me sento para almoçar, não atendo telefone, e eles não veem televisão”, conta. “Assisto a futebol na TV com eles. Não tenho muito hábito de ir ao estádio, pela minha rotina. Mas jogo bola... Eles adoram”.
A família já se acostumou com sua rotina de viagens. “Meus filhos mais velhos já dormiram em trailer comigo, vivendo do circo e do teatro”, revela. Mas agora o lado aventureiro de Domingos vem se identificando com o navegador, e ele já não descarta a possibilidade de ter um barco. “É apaixonante, sentir o vento no rosto, controlar a vela, a liberdade e o contato com a natureza”, diz ele, que fez aulas para velejar. “O barco tem semelhanças com o circo, uma rotina de manutenção. O mundo do velejador é o barco. No circo, a vida é a lona”.


Publicada em 14/06/2015 – O DIA
Foto Maíra Coelho




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